16.11.08

Fundo do Poço

Demorei um tempo bem grande para compreender o sentido real da expressão 'fundo do poço', depois de descobrir que ela existia metaforicamente. Seu significado era óbvio, mas você só agrega valor quando experimenta a situação que cunhou tal expressão.

Quando criança, desenvolvi mecanismos próprios para que o mundo dentro de mim fizesse sentido. Alternando a percepção da realidade cotidiana de uma sociedade em movimento constante, com a imaginação de um lugar seguro onde pudesse abrigar a minha alma e a minha mente em circunstâncias desagradáveis ou sem explicação. O poço, no caso, era apenas uma fonte de água a brotar...

No período da adolescência tudo fica naturalmente [e fisiologicamente] mais complicado. A constante variação de humor é um dado de realidade contra o qual não se pode lutar [não de forma justa e na total compreensão da tática do inimigo, que é silencioso e ardil]. Não é uma luta justa. Somam-se a isso as tantas variáveis que a história de vida de cada revela: as dores, as lutas, as vitórias, as relações, os exemplos, as doenças, os amigos, a educação, a moral, os locais que freqüenta, as roupas que usa, a música que ouve, os livros que lê, a família que tem, os segredos que guarda, os mistérios que desvenda, os choques de realidade, a falta de atenção, os dramas, os medos e a sua própria personalidade, que dita a maneira pela qual você vai lidar com isso tudo [também].

Eu jamais desejaria voltar aos meus tempos teen. Foi uma fase muito gostosa, com momentos dignos de serem eternizados, mas foi um período obscuro e de muita incompreensão... Foi aí que eu conheci o 'fundo do poço'. Mas o meu poço ainda estava em formação...

Ainda misturo o que chamo de fase jovem e fase adulta. Eu me sinto no limiar das duas. Foi na fase jovem que entendi o que era 'fundo do poço'. Sofri as piores dores, fruto de ações humanas e de deficiências até então não reveladas. E uma vez que você visita esse lugar escuro e de difícil respiração, você acaba morrendo de medo de ter que voltar para lá um dia. E se protege do poço. E se protege da vida.


Gostei de ouvir a Adriane Galisteu falar, uma vez, que o poço dela "tem uma mola no fundo: toda vez que ela bate lá, necessariamente tem que voltar para cima". Muitas vezes você necessita de alguém lá no topo para te dar a mão e te puxar [e não há vergonha nisso. Quem é soberbo tem dificuldade de receber ajuda. Quem é egoísta, tem dificuldade de ofertá-la].

Tenho vivido dias no poço. Ora lá de cima, bebendo a água mais fresca e cristalina. Distribuindo esse bem precioso para os que me cercam. Ora, saltando dentro do poço, não atrás da tal mola lá no fundo; mas de bungee jump, num sobe e desce vertiginoso e assustador. Fatos da vida passando em disparada e alternando sentimentos que não conseguem encontrar repouso. Você já se sentiu assim?

E quando a cuca está dando pinote dentro da cabeça e o óbvio parece tão 'simples', quanto a teoria da relatividade... Eis que surge uma luz. Simples e direta. Minha amiga da faculdade, MarciaBitt, conseguiu desenvolver uma relação comigo à distância geograficamente, mas muito próxima ao coração. Nos e-mails que a gente troca, a vida é passada em revista com muita segurança sobre quem está ouvindo e de que forma a informação será processada e devolvida. A cada e-mail a gente cresce como mulher do seu tempo, como amiga e como profissional. E nessa última troca de recados, ela me disse:

"Tenha a certeza de que épocas de muito sofrimento são a premissa de fases muito boas na seqüência. É sempre assim comigo e eu tenho observado isso na sua vida também. Vamos ao fundo do poço e, de repente, o céu parece que se abre. Traz novas oportunidades e a energia boa que precisamos para tocar o barco."

A presença física é um detalhe, quando as palavras preenchem um espaço de dimensões tão importantes. Ela conforta. E espero que as minhas palavras ganhem eco e conforto na vida de quem precisar. Somos todos humanos, sujeitos a altos e baixos; sorrisos e prantos; por do sol e intempéries. É o enredo da vida que é vivida em seus termos.

2 comentários:

:-) disse...

Olá Bibi, olha eu aqui de novo de passagem e desta vez para agradecer sua vista e comentario lá na minha horta e por este texto, pois hoje foi dia de "perfuracao de poco" e isso acontece quando a gente vai acumulando as coisas, ou seja, a fase de ferir e furar a terra até achar o que quer, melhor dizendo a tao sonhada agua cristalina. Ela ainda nao está jorrando como desejo, pois o processo de perfuracao doe e muito, mas é isso aí, vamos em frente e sempre confiando em Deus, que sabe todas as coisas e o que é melhor para nós.
Grande abraco, fique com Deus e tenha uma otima semana.
Natalia
PS - Se Deus quiser estarei na cidade Maravilhosa em dezembro.

Anne Katheryne disse...

Acho que conhecer a escuridão do céu de uma tempestade é imprescindível pra reconhecer o azul do céu, mesmo que nele haja algumas esparças nuvens.